Carlos Martins recorda a doença do filho: " A vida [dele] dependia de um saco de sangue de medula. A prova da minha vida foi essa"

O filho mais velho do futebolista foi diagnosticado com uma aplasia medular aos três anos. Gustavo precisava de um transplante urgente de medula óssea.

Famosos

Carlos Martins
Valerio Pennicino

Corria o ano de 2011 quando o filho mais velho de Carlos Martins, Gustavo, na altura com três anos, foi diagnosticado com uma aplasia medular - doença rara caracterizada pelo funcionamento deficiente da medula óssea, que deixa de produzir as células do sangue, como os eritrócitos, leucócitos e plaquetas. O menino precisava de um transplante urgente de medula óssea. O dador compatível viria a ser encontrado em 2012.

Entretanto, quase sete anos depois do diagnóstico da doença e Gustavo totalmente recuperado, o ex-jogador do Benfica e do Sporting, recordou, em entrevista ao site Tribuna, do Expresso, toda a luta e os momentos de angústia e de dor.

O diagnóstico da doença

Na altura, o futebolista e a família residiam em Espanha. Carlos Martins representava o emblema espanhol do Granada e os primeiros sinais de que algo não estava bem com o pequeno Gustavo surgiram quando este sofreu um pequeno acidente doméstico.

“Caiu-lhe uma gaveta em cima da perna e ele ficou com uma grande nódoa negra. A minha mulher manda uma foto a um médico daqui e pergunta-lhe se é normal ele ficar assim passado uns minutos. Ela foi a uma clínica lá em Granada, eu fiquei com a Bruna e o Martim em casa que tinha uns 8, 9 meses na altura. Ela liga a dizer que já não deixam sair o meu filho, que tinha de ser internado”, confidenciou.

"Não, não pode ser, o menino está bem. Amanhã já está tudo bem". No outro dia dizem que tem de fazer uma punção, falam em leucemia e que o meu filho corre risco de vida e que se calhar precisa de um transplante... Esteve 17 dias internado. Foi muito difícil. Andei três meses anestesiado, recordou.

“Eu nem sabia o que era isso [aplasia medular]. Quando me disseram eu perguntei "Ok, é preciso pagar o quê? É preciso ele ir para algum lado para ser curado? Digam-me". Foi quando ele me disse: "Carlos, não é dinheiro. Tem que existir alguém, um dador que seja compatível com o teu filho"

Nenhum membro da família era compatível com o pequeno Gustavo e a fertilização in vitro chegou ser uma hipótese colocada em cima da mesa pelos médicos. “Em Sevilha chegaram a dizer que com uma gravidez em vitro, fazendo um tratamento para nascer um filho com o tipo de sangue do Gustavo... Mas primeiro que engravidasse, depois o tempo de espera e mais não sei quê, e nós a vivemos a situação. Esquece”, referiu.

Sem conseguirem encontrar um dador compatível, a angustia crescia de dia para dia e foi aí que Carlos Martins decidiu fazer um apelo público. “Estava desesperado. Eu não aguentava mais. Era transfusões de sangue, de plaquetas ... Muita coisa mesmo”, recordou emocionado.

É encontrado um dador compatível

Entretanto, em 2012, eis que chega a notícia de que foi encontrado um dador compatível em Boston, nos Estados Unidos. “Sei que tinha 42 anos e que quando soube que era para um menino de 3 anos prontificou-se logo a dar da medula. Normalmente dão o sangue da veia, mas como era para um menino, disse para lhe tirarem mesmo da medula. Mandou não sei quantos sacos. Quando ele foi fazer o transplante a mudança da vida dele estava num saco de plástico. Isto é... Aquele Dr. Nuno Miranda, eu chorava tanto com ele. Foi espetacular. À frente da minha mulher tentava sempre não chorar, mas quando chegava ao pé dele "Ó Dr. ouça, eu tenho a minha vida em si, este menino nunca ninguém me pode levar Dr.’", confidenciou.

Agarrei-me muito a Deus e à N. Srª de Fatima. Agarrei-me a tudo o que fiz de menos bom na minha vida. Lembro-me que o meu espaço favorito era o Guincho, ia para lá, fartava-me de desenhar corações na areia sempre com o nome dele…. A prova da minha vida foi essa, não foi mais nenhuma. Não foi de ter passado do Sporting para o Benfica, isso são historias para contar, para a gente se rir, uns vão gostar mais outros menos”, contou.

A desistência do Europeu de futebol de 2012

Na altura em que o pequeno Gustavo foi submetido ao transplante de medula óssea, Carlos Martins tinha sido convocado pelo então selecionador nacional, Paulo Bento, para representar Portugal no Europeu de Futebol de Futebol 2012, mas acabou por desistir. Numa visita ao filho no hospital, o futebolista entendeu que, naquele momento o seu lugar era ao lado do filho. "Olha filho, agora vais ver o pai durante um tempo ali na televisão. O pai vai fazer um golo para ti, amor". Ele desata num choro: "Ó pai não vás, quero-te aqui, quero-te aqui". Eu hoje tenho uma ligação com o meu filho, não sei explicar de que grau é porque não existe. Agarra-se a mim e eu disse-lhe: "Filho, o pai vai mas amanhã o pai está aqui". Já sabia naquele preciso momento que ia chegar à seleção e ia dizer que não jogava. Entrei no carro com o meu pai e disse-lhe: "Olha pai, tinhas muito gosto em ver o teu filho no Europeu, mas eu venho para o pé do meu". E o meu pai: ‘Ó filho, não estava à espera de outra reação tua’”, recordou.

“Cheguei a Óbidos, chamei o Paulo Bento e disse-lhe para chamar outra pessoa para o meu lugar Foi chamado o Hugo Viana. Vamos inventar aqui uma história que estou lesionado. Isto foi na altura em que ele fez o transplante e as coisas correm bem”, contou.

O nascimento da pequena Maria Inês

Em março de 2013, quase um ano após o transplante de Gustavo, Carlos Martins e a mulher, Mónica, foram novamente pais, desta vez de uma menina.

A Maria Inês foi feita na altura em que estávamos a passar por este processo todo. Foi uma menina tão desejada, tão desejada, que veio 100% compatível com o Gustavo. Quando o médico nos diz: "Temos aqui uma novidade para vocês. A sua filha que acabou de nascer é compatível com o irmão". Há coisas... . Nós ainda temos mais um saco, mas só de termos a nossa menina que é compatível com o irmão... E têm uma ligação os dois que nem imagina. Há coisas que não dá para explicar”, rematou.

Recorde-se que além de Gustavo, atualmente com dez anos, e Maria Inês, com seis, o casal é pai de Martim, com oito anos. Mónica é ainda mãe de Bruna, com 18 anos, fruto de um relacionamento anterior.